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A produção industrial de refrigerantes baseia-se na sequência de operações comuns às variantes carbonatada e lisa, nomeadamente a preparação de um xarope concentrado contendo os ingredientes da formulação, a diluição proporcionada do xarope com água tratada, o enchimento e a pasteurização da bebida final. No caso dos refrigerantes carbonatados, além destas, é necessário realizar-se a carbonatação da bebida e no enchimento deverá ser utilizado um sistema de contrapressão.
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Esquema geral de fabrico industrial de refrigerantes (adaptado de RIBEIRO, 2011)
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Preparação do xarope
A preparação do xarope é uma etapa comum e fulcral na produção de refrigerantes carbonatados e não carbonatados. Consiste na medição precisa, na adição e mistura dos componentes chave da bebida, de modo a obter-se um xarope com as características de qualidade necessárias (e.g. Brix) para que, na etapa seguinte, possa ser diluído com água tratada numa determinada proporção. Esta etapa inicia-se com a preparação de um xarope simples que resulta unicamente da dissolução da quantidade prescrita de adoçante num determinado volume de água tratada, seguida de filtração para remoção de impurezas. O xarope simples é transferido para um segundo tanque onde são adicionados sequencialmente os restantes componentes nas quantidades prescritas e que compõem a base da bebida (SHACHMAN, 2005). Geralmente começa-se por adicionar os conservantes, seguindo-se os acidulantes, os corantes, os aromatizantes e os restantes componentes (ASHURST, 2005). Os componentes base da bebida são misturados no xarope simples por ação de um agitador mecânico até ficarem completamente dissolvidos. Interrompendo a agitação é adicionada uma quantidade de água tratada de modo a atingir-se o volume prescrito para o xarope. O xarope final obtido, também designado xarope condimentado, é deixado a repousar durante algum tempo para desarejar de modo a evitarem-se deteriorações na cor e aroma (SHACHMAN, 2005). Para que se evitem perdas económicas avultadas resultantes da obtenção de um xarope condimentado com parâmetros de qualidade fora do especificado, é fundamental proceder à medição precisa dos pesos dos componentes e correto ajuste do volume final do xarope. Algumas indústrias não executam esta etapa na produção de refrigerantes não carbonatados. Em alternativa, dissolvem diretamente os ingredientes nas concentrações encontradas no produto final. No entanto, a inclusão da etapa de preparação de xarope confere maiores vantagens ao processo de fabrico. Entre essas vantagens constam os menores custos associados à utilização de tanques e das respetivas áreas de laboração, que podem possuir menores dimensões; e a maior versatilidade introduzida no planeamento de fabrico e enchimento, uma vez que o lote produzido pode ser utilizado no próprio dia ou até 24 horas após a preparação sem que ocorra deterioração. O elevado valor de Brix (50-60º) dos xaropes torna-os resistentes à deterioração microbiana durante o período de armazenamento que antecede a diluição e enchimento. Outras vantagens são a maior facilidade de deteção e correção de defeitos (sabor, doçura, acidez, cor, turvação, etc.) uma vez que estes encontram-se ampliados devido às elevadas concentrações dos ingredientes no xarope. Erros nas pesagens dos ingredientes podem ser rapidamente corrigidos preparando-se outro tanque de xarope “compensatório” (SHACHMAN, 2005). Pasteurização do xarope Após a produção do xarope condimentado é aconselhável proceder à eliminação de microrganismos por forma a garantir uma maior durabilidade durante o armazenamento. Para tal pode ser utilizado um pasteurizador tipo flash, no qual o produto a pasteurizar circula com um determinado caudal no interior de superfícies fechadas (placas ou tubos) e aquecidas a uma temperatura adequada. Diluição proporcionada Na etapa seguinte ocorre a diluição do xarope numa proporção pré-estabelecida de 1 parte (volume) de xarope para 3 a 6 partes (volumes) de água, obtendo-se assim a bebida final não carbonatada (ASHURST, 2005) com as características pretendidas (e.g., valor de Brix, teores dos vários componentes, etc.). Por exemplo, diluindo uma parte de xarope de 54.70ºB com cinco partes de água obtém-se uma bebida com um Brix próximo de 11ºB (SHACHMAN, 2005). A diluição é realizada num equipamento designado proporcionador de xarope (syrup proportioner), que procede ao doseamento do xarope e da água utilizando bombas doseadoras de pistões ajustáveis manualmente, ou no caso das versões mais complexas, utilizando doseadores de fluxo computadorizados. Este equipamento tem em conta a densidade do xarope para que seja possível obter a bebida com o valor de Brix pretendido. O produto final pode ser conduzido para reservatórios ou para o carbonatador. Adaptações recentes destes equipamentos permitem proceder à diluição dos vários componentes da bebida em separado ao invés da sua mistura prévia (premix) (ASHURST, 2005). Carbonatação Nesta etapa, ao xarope diluído, homogeneizado e refrigerado é feita a adição física de dióxido de carbono, obtendo-se a bebida final carbonatada pronta a ser enviada para o sistema de enchimento. Assumindo que o xarope foi diluído em água desarejada nas proporções adequadas, a eficiência da operação de carbonatação é influenciada pela área de contacto entre a fase líquida e o gás. Quanto maior a área de exposição do líquido ao dióxido de carbono, maior é a velocidade de absorção do gás pelo liquido. Geralmente nos carbonatadores o dióxido de carbono é aspergido para o líquido contido num tanque pressurizado com este gás. Quanto maior for a pressão interna, maior é a área total de superfície das bolha de gás formadas, devido às suas menores dimensões. Outra forma de maximizar a área de contacto em alguns carbonatadores consiste em fazer o escorrimento do líquido através de pratos refrigerados dispostos verticalmente num tanque pressurizado com dióxido de carbono. As finas camadas de líquido à superfície dos pratos apresentam uma área suficientemente elevada para absorverem eficazmente o gás (ASHURST, 2005). O controlo da temperatura do líquido a carbonatar é essencial, pois condiciona a pressão de gás utilizada para se obter o nível de carbonatação desejado. Por exemplo, para bebidas que requeiram um elevado nível de carbonatação a solução é arrefecida até uma temperatura inferior a 10ºC e é utilizada uma pressão de dióxido de carbono igual ou superior a 30 psi (≈ 2 bar). Se necessário, os operadores podem consultar uma tabela de volumes de dióxido de carbono de modo a conhecerem o binómio temperatura/pressão adequado ao volume de dióxido de carbono pretendido na bebida. No entanto, estes valores podem ser diferentes como resultado de escolhas que têm em conta as capacidades e limitações do equipamento (SHACHMAN, 2005). Por outro lado, como a solubilidade do gás diminui com o aumento da temperatura do líquido, a refrigeração da bebida carbonatada é essencial para se minimizarem problemas de espumação durante a etapa de enchimento. Enchimento Geralmente, o enchimento de refrigerantes é realizado em enchedoras nas quais a bebida é transferida, por ação da gravidade, de uma vasilha de enchimento do equipamento para o interior das embalagens atravessando válvulas de enchimento. Antes do enchimento, a embalagem é selada por contacto firme com a boca da vasilha de modo a que não ocorram fugas de líquido e/ou de pressão de gás. A vasilha é parcialmente preenchida com um volume preciso de bebida assegurando-se a existência de um headspace sempre com a mesma pressão. Quando a válvula é aberta e se inicia o enchimento, o gás contido no interior da embalagem é transferido através de um tubo para o headspace da vasilha. A velocidade de fluxo de bebida transferida da vasilha para a embalagem é proporcional à velocidade de fluxo de gás transferido no sentido contrário. O enchimento termina quando o tubo fica coberto pelo líquido e as pressões no interior da vasilha e da embalagem se igualam. Nessa altura, a embalagem cheia é separada da vasilha e a bebida que ainda permanece no tubo é escorrido para a embalagem (ASHURST, 2005). No caso dos refrigerantes carbonatados, uma vez feita a selagem do sistema vasilha-embalagem, é feita a evacuação da maior parte do ar contido no interior da embalagem, e parte do dióxido de carbono do headspace da vasilha é transferido para a embalagem estabelecendo-se um equilíbrio de pressão no sistema. Este equilíbrio de pressão permite que a bebida flua da vasilha pela válvula de enchimento até à embalagem. No entanto, parte do dióxido de carbono dissolvido na bebida é libertado fazendo aumentar a pressão interna da embalagem. Para que não ocorra a cessação do fluxo de bebida, qualquer excesso de pressão deverá ser libertado através de uma válvula de escape (snifting) (ASHURST, 2005) (SHACHMAN, 2005). A maioria dos refrigerantes é embalada em embalagens pré-fabricadas cujo material pertence a um dos três tipos principais: vidro, lata, e plástico. A utilização destes materiais apresenta associadas vantagens e desvantagens que acabam por influenciar o tempo de vida ou de prateleira (shelf life) do produto. Devido às suas características físico-químicas, o vidro tem sido o material mais utilizado no engarrafamento de bebidas. Assumindo que a cápsula aplicada à boca das garrafas garante uma boa estanquicidade, este material permite que não ocorram perdas de conteúdo por transmissão de vapor de água, além de possuir uma excelente retenção de dióxido de carbono e uma reduzida taxa de transferência de oxigénio. O vidro é um material inerte, pelo que oferece um risco baixo de contaminação da bebida. Adicionalmente, a possibilidade de ser colorido ou revestido permite a diferenciação do produto e a redução do efeito da luz nos componentes da bebida. Do ponto de vista económico e ambiental, as embalagens de vidro oferecem a vantagem de poderem ser reutilizadas e recicladas. Os problemas encontrados da utilização deste material são o peso e o risco de causar lesões nos consumidores dado a sua baixa resistência à fratura. O tempo de vida das bebidas engarrafadas em vidro é afetado pelo armazenamento a temperaturas elevadas, pela exposição à luz (ASHURST, P., 2011). A utilização de latas metálicas tem, nos últimos anos, tido maior expressão na produção de bebidas em doses individuais devido à sua maior conveniência, robustez e imagem. Na sua maioria as latas são constituídas por duas partes de alumínio que, desde que deviamente encaixadas e isentas de corrosão, conferem alta proteção contra fugas de líquido e de dióxido de carbono, e ingresso de oxigénio. Face às embalagens de vidro, as latas são mais leves, menos frágeis, e o conteúdo está completamente protegido dos efeitos de exposição à luz (ASHURST, P., 2011). Atualmente, o embalamento em latas está praticamente limitado às bebidas carbonatadas devido à estabilidade física conferida pela pressão interna de dióxido de carbono, o que tem permitido reduzir a espessura das paredes da lata. No caso dos refrigerantes não carbonatados a pressurização que permite que não ocorra distorção da lata é conseguida com a injeção de azoto líquido. As principais desvantagens da utilização de latas são a sua inadequação para a contenção de volumes elevados de bebida, e o risco de contaminação através do material devido a possíveis reações com os componentes da bebida. Por vezes é necessário ajustar a formulação de modo a evitar o aparecimento de sabores metálicos derivado da dissolução de metais da lata (ASHURST, P., 2011). Diversos plásticos podem ser utilizados para o embalamento de bebidas, sendo o PET o mais predominante. A sua relativa robustez e baixo peso tornam-no indicado para a contenção de volumes mais elevados de bebida, além de possuir uma clareza comparável à do vidro. A maior porosidade relativamente a outros materiais de embalagem torna-o mais permeável aos gases, permitindo quer a perda de dióxido de carbono, quer a entrada de oxigénio do exterior. Por esta razão, as indústrias de refrigerantes carbonatados estipulam um tempo de vida mais curto para os seus produtos, ou em alternativa, estes são produzidos com um nível de carbonatação superior que permita compensar a perda do gás por difusão durante o armazenamento (SHACHMAN, 2005). No caso das bebidas não carbonatadas, a transferência de oxigénio do exterior, obriga à utilização de antioxidantes na formulação do produto para incrementar o seu tempo de vida (ASHURST, P., 2011). Alguns fabricantes de bebidas refrigerantes não carbonatadas recorrem a linhas de embalagem assética como meio de prevenção de alguns problemas agravados pela ausência de dióxido de carbono dissolvido, nomeadamente a deterioração microbiológica por leveduras e bactérias, e a ocorrência de reações de oxidação conducentes à deterioração do sabor e da aparência do produto. Apesar dos custos associados, o enchimento assético surge como alternativa à utilização de pasteurização flash, à aplicação de medidas escrupulosas de higiene, e ao controlo rigoroso das formulações (e.g. níveis de conservantes, antioxidantes, corantes e aromatizantes) (ASHURST, 2005). As embalagens utilizadas para este tipo de enchimento (e.g. TetraPak, Combibloc) utilizam um material laminado composto por diversas camadas contendo polietileno, cartão, e alumínio. Este material, além de ser leve, confere um alto nível de proteção à bebida, e possibilita uma superfície mais adequada a uma ornamentação apelativa. As desvantagens associadas a este material são o fato de terem uma capacidade limitada (até 1L) e de na formulação ter de ser necessário excluir componentes que reajam com a camada de alumínio, por exemplo o dióxido de enxofre usado como conservante (ASHURST, P., 2011). A etapa de enchimento fica completa com a selagem das latas ou com aplicação de cápsulas de alumínio e de polietileno moldável (LDPE ou HDPE), respetivamente nas garrafas de vidro e de PET (ASHURST, 2005). Pasteurização Após o enchimento, as garrafas e latas contendo a bebida são submetidas a pasteurização. Esta operação unitária tem como objetivo a destruição, por ação do calor, de microrganismos, sobretudo bactérias que possam estar presentes no produto, sem que as suas propriedades sensoriais sejam significativamente afetadas. Estas bactérias se não forem destruídas, reduzem o tempo de vida do produto e, dependendo da sua patogenicidade, podem inclusivamente causar danos na saúde do consumidor. Na operação de pasteurização podem utilizar-se dois tipos diferentes de equipamento: um tanque de pasteurização ou um pasteurizador em túnel. O tanque de pasteurização possibilita um tratamento térmico mais económico do produto já que consiste unicamente num tanque no qual é feita a imersão em água das embalagens a pasteurizar. São utilizados diferentes patamares de tempo/temperatura cujos valores são monitorizados utilizando um sensor de temperatura remoto que é mergulhado numa das embalagens imersas. Os pasteurizadores em túnel são equipamentos dispendiosos e de grandes dimensões dentro dos quais as embalagens são transportadas e borrifadas com água quente a uma temperatura que depende da etapa do tratamento térmico (pré-aquecimento, zona de pasteurização, arrefecimento). Geralmente as condições requeridas de pasteurização são temperaturas de 70 a 75ºC durante períodos até 20 minutos (ASHURST, 2005). |
Referências:
ASHURST, P. (2005). Chemistry and Technology of Soft Drinks and Fruit Juices. Hereford (UK): Blackwell Publishing.
ASHURST, P. (2011). The Stability and Shelf Life of Fruit Juices and Soft Drinks. In A. a. Associates, Food and Beverage Stability and Shelf Life (pp. 571-593). UK.
RIBEIRO, T. (2011). Desenvolvimento de um novo conceito de refrigerante. Dissertação para obtenção de grau de mestre em Tecnologia e Segurança Alimentar.
SACHMAN, M. (2005). The Soft Drinks Companion - A Technical Handbook for the Beverage Industry. Boca Raton, EUA: CRC Press.
ASHURST, P. (2005). Chemistry and Technology of Soft Drinks and Fruit Juices. Hereford (UK): Blackwell Publishing.
ASHURST, P. (2011). The Stability and Shelf Life of Fruit Juices and Soft Drinks. In A. a. Associates, Food and Beverage Stability and Shelf Life (pp. 571-593). UK.
RIBEIRO, T. (2011). Desenvolvimento de um novo conceito de refrigerante. Dissertação para obtenção de grau de mestre em Tecnologia e Segurança Alimentar.
SACHMAN, M. (2005). The Soft Drinks Companion - A Technical Handbook for the Beverage Industry. Boca Raton, EUA: CRC Press.
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