O lúpulo utilizado na cerveja corresponde à flor feminina da planta dióica perene denominada Humulus Lupulus, ou aos seus derivados (e.g. pellets e extratos de lúpulo). Esta planta trepadeira é oriunda das regiões subtropicais da Europa e da Ásia. As flores assemelham-se a pequenas pinhas cujas brácteas de cor verde encerram no seu interior a glândula lupulínica (FERNANDES, 2015).
Lúpulo: a) Cultivo da planta (adaptado de RODRIGUES, 2016); b) Flor de lúpulo (adaptado de CRIALE, 2016); c) Estrutura da flor (adaptado de CBA, 2016)
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Na sua composição, o lúpulo apresenta componentes que desempenham um papel fundamental no processo de fabrico e na qualidade da cerveja. É o caso das resinas, dos óleos e dos polifenóis.
As resinas representam 14-21% do peso total (em matéria seca) da flor de lúpulo e são responsáveis pelo sabor amargo que este componente confere à cerveja. Atuam também como estabilizantes da espuma e como antissépticos, controlando o crescimento de alguns microrganismos indesejáveis. Entre as resinas presentes na flor de lúpulo incluem-se as humulonas (ou ácidos-α), as lupulonas (ou ácidos-β), a hulupulona e os ácidos húmicos. Os ácidos-α sob a ação do calor da operação de ebulição sofrem isomerização originando compostos mais solúveis, os iso-α-ácidos. Estes compostos resistem à precipitação durante o arrefecimento e fermentação do mosto, chegando ao produto acabado onde são os principais responsáveis pelo amargor. Os óleos são componentes voláteis, responsáveis pelo aroma característico do lúpulo. Na flor representam cerca de 0.5-1.5% do seu peso (em matéria seca) estando localizadas na glândula lupulínica tal como as resinas. Os óleos mais predominantes são o mirceno, que confere um aroma aguçado à cerveja, o humuleno e o β-cariofileno que, pelo contrário, conferem aromas mais agradáveis (KUNZE, 1999). Os polifenóis estão presentes nas pétalas e no eixo central das flores de lúpulo, representando cerca de 2-5% do seu peso em matéria seca. Consistem numa mistura constituída principalmente por antocianogénicos, além de taninos, flavonóis e catequinas. Estas substâncias, apesar de se encontrarem em pequenas quantidades no mosto, são responsáveis por uma série de importantes propriedades: conferem sabor adstringente; combinam-se com proteínas do mosto formando turvações; por oxidação formam compostos que conferem tonalidades vermelhas a acastanhadas; reagem com sais de ferro formando compostos escuros (KUNZE, 1999). O cultivo de lúpulo é realizado em regiões de clima temperado, tradicionalmente no Hemisfério Norte entre as latitudes de 30 e 50º. A planta deve estar exposta a pelo menos quatro meses de frio invernal, ser devidamente regada, e receber luz do sol diretamente (KUNZE, 1999). Dependendo da variedade e do clima do local de cultivo, a planta pode ser suscetível à ocorrência de pragas e doenças desencadeadas por agentes patogénicos, nomeadamente fungos, bactérias, vírus, insetos e nemátodos (SOUSA, 2005). Geralmente, a colheita das flores das plantas de lúpulo (com mais de dois anos) é feita no final do verão, entre os meses de agosto e setembro, devendo ser realizada no prazo máximo de catorze dias. Logo após a colheita as flores devem ser imediatamente secas (a cerca de 50ºC) até um teor de humidade de 8-12%, comprimidas hidraulicamente em fardos que, depois de revestidos com um material sintético, são conservados no frio. Como resultado da compressão é reduzido o ar contido nos interstícios capaz de provocar oxidações, e dificultada a reabsorção de humidade que favorece a proliferação de microrganismos (KUNZE, 1999). Inúmeras variedades de lúpulo são cultivadas com vista à produção de cerveja. Conforme a quantidade de resinas (ácidos-α) ou de óleos essenciais presentes, as variedades de lúpulo podem ser classificadas respetivamente em variedades de amargo ou de aroma (UNICER, 2016d). O leque de aromas que pode obter-se a partir do lúpulo inclui tons herbáceos, florais, cítricos, frutados ou botânicos. As variedades inglesas Fluggles e Goldings, utilizadas nas cervejas ale são bastante aromáticas e com baixa acidez. A Northdown confere amargor e aroma as ales e lagers, e o Saaz usado nas Pilsners originais é mais aromático (FERNANDES, 2015). Na etapa de ebulição do mosto podem ser utilizados uma ou mais variedades de lúpulo. Geralmente as variedades de amargo são acrescentadas no início da ebulição enquanto as variedades de aroma são adicionadas no final (FERNANDES, 2015). A utilização de produtos transformados de lúpulo como pellets e extratos apresenta uma série de vantagens face à do produto não transformado. Os produtos transformados podem ser armazenados durante períodos de tempo substancialmente mais alargados sem sofrerem redução da sua qualidade, são mais facilmente doseados, requerem menores custos de transporte e armazenamento, e possibilitam obter cervejas com intensidades de amargor mais elevados e constantes (KUNZE, 1999). No processo de fabrico de pellets, as flores de lúpulo são secas, moídas e peneiradas, sendo a farinha resultante submetida a prensagem em moldes cilíndricos. O produto é arrefecido e embalado, utilizando-se atmosfera modificada, composta essencialmente por dióxido de carbono ou azoto, de modo a preservar-se a sua qualidade. Atualmente são produzidos pellets de lúpulo contendo diferentes concentrações de óleos e resinas (pellets tipo 90 e enriquecidos) e em que os ácidos-α sofreram isomerização química (pellets isomerizados). A utilização destes últimos tem como vantagem a principal a redução do tempo da operação de ebulição e consequentemente uma redução nos custos energéticos do fabrico de cerveja. A intensidade de amargor das cervejas vem mais aumentado devido ao elevado teor de iso-α-ácidos (KUNZE, 1999). Na produção de extratos, o lúpulo é misturado em solventes (etanol, dióxido de carbono líquido ou supercrítico) para que seja feita a dissolução completa das resinas e dos óleos. Posteriormente à dissolução é feita a concentração por evaporação do solvente até uma extensão pretendida, obtendo-se um extrato líquido. O solvente é recuperado para ser utilizado em novas operações de extração. No mercado estão disponíveis extratos de lúpulo no estado líquido, em pó, e isomerizados (KUNZE, 1999). |
Referências:
FERNANDES, E. (2015). O livro das cervejas - Super bock. UNICER.
KUNZE, W. (1999). Technology Brewing and Malting (2.ª ed.). Berlim (Alemanha): VLB Berlin.
SOUSA, M. J. (2005). Obtenção de plantas de Humulus lupulus L.resistentes a vírus. Dissertação de Doutoramento em Biologia Vegetal. Lisboa.
FERNANDES, E. (2015). O livro das cervejas - Super bock. UNICER.
KUNZE, W. (1999). Technology Brewing and Malting (2.ª ed.). Berlim (Alemanha): VLB Berlin.
SOUSA, M. J. (2005). Obtenção de plantas de Humulus lupulus L.resistentes a vírus. Dissertação de Doutoramento em Biologia Vegetal. Lisboa.
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