Definição e importância da cera
A Norma Portuguesa NP-136 de 1967 define a cera de abelha como “uma substância plástica, tenaz, não untuosa, nem aderente à pele. Fundida, produz mancha translúcida no papel. Apresenta-se amarela, avermelhada ou castanha, quando não tiver sido branqueada” (BARROS, 2009). A cera de abelha é essencial para o desenvolvimento da criação e para o armazenamento do mel e pólen, e para a regulação da temperatura da colónia. As condições para a segregação da cera pelas glândulas ceríferas das obreiras são a escuridão, a presença de rainha e a disponibilidade de alimento, nomeadamente pólen e mel. Estima-se que para produzir 1Kg de cera é necessário o consumo de 7Kg de mel pelas obreiras, ou seja cerca de 15% do mel consumido em 1 ano. Para que a obreira tenha capacidade de moldar a cera são necessárias determinadas condições de humidade e temperatura no interior da colmeia. A humidade é obtida através da respiração da colónia e da desidratação da mistura néctar/melada+enzimas no interior da colmeia, enquanto que a temperatura resulta do próprio metabolismo das abelhas (BARROS, 2009). A qualidade da cera interfere com a “saúde” da colónia, e portanto com o seu desenvolvimento e capacidade de produção de produtos apícolas. Como tal deve ser evitada a utilização de ceras velhas ou adulteradas. As ceras velhas devem ser substituídas por ceras novas pois nestas ocorre uma maior postura da rainha, um maior desenvolvimento das larvas, além de estarem isentas de substâncias indesejáveis que podem contaminar o mel, nomeadamente produtos fitossanitários (p.e. acaricidas utilizados no combate à Varroa destructor), esporos de fungos e de bactérias (p.e. Loque americana) e metais pesados. A utilização de ceras adulteradas nos apiários pode provocar a rejeição destas por parte das abelhas que por este motivo não procedem à construção dos favos, atrasando a produção de mel e o desenvolvimento da colónia, o que acaba por se refletir em perdas económicas para a exploração apícola. A adulteração normalmente é feita com a incorporação de ceras vegetais e industriais como a parafina, o sebo e estearina/ácido esteárico. Estas gorduras, por possuírem uma composição química diferente, afetam alguns parâmetros físico-químicos da cera que podem ser utilizados para a deteção de adulteração (BARROS, 2009). Composição e propriedades A cera de abelha é essencialmente uma mistura de substâncias de carácter lipídico que confere ao produto uma elevada hidrofobicidade. Entre os componentes maioritários da cera de abelhas constam hidrocarbonetos (14-16%), ácidos gordos livres (12-15%), monoésteres (41%), diésteres (7%) e hidroximonoésteres (9%). Esta matéria-prima é composta também por outros componentes minoritários, nomeadamente proteínas (introduzidas no processo de mastigação das escamas de cera segregadas), compostos fenólicos e terpenos derivados do própolis e do pólen. A rigidez e a cor da cera (não branqueada) são influenciadas pela presença nos favos excrementos das abelhas, pólen, própolis e fibras sedosas nos favos. A composição depende da subespécie de Apis mellifera, da idade da cera, das condições climáticas da sua produção e da aplicação de processos de purificação e branqueamento (BARROS, 2009). As variações são sobretudo ao nível da quantidade relativa dos diferentes componentes e não da sua natureza. Com o envelhecimento, as ceras vão perdendo alguns dos seus componentes por volatilização diferencial. Os processos de purificação de ceras, visam a remoção de contaminantes e envolvem o seu aquecimento a temperaturas elevadas (>120ºC) durante longos períodos de tempo, do qual podem resultar perdas de componentes voláteis e reações de polimerização que por sua vez provocam outras alterações indesejadas como escurecimento, aumento da friabilidade e perda de rendimento. Os agentes utilizados para a remoção de cor da cera (branqueamento) podem provocar a degradação oxidativa de alguns componentes insaturados caso não seja respeitada a duração e a intensidade do tratamento (BARROS, 2009). Obtenção, Transformação e Armazenamento Na produção de cera podem ser utilizadas as ceras dos favos (“ceras de ninho”) e a dos opérculos. A cera dos opérculos deve ser bem separada do mel pois este é um veículo de esporos da Loque americana. A separação deve ocorrer em tinas de desoperculação em inox, seguindo-se operações de centrifugação, prensagem e lavagem. As ceras dos favos devem ser sujeitas a uma seleção prévia, rejeitando-se as que já são velhas, as adulteradas e as que apresentem evidência de doenças apícolas. Como foi referido anteriormente as ceras velhas devem ser rejeitadas porque acumulam mais sujidade, contaminantes (pesticidas, acaricidas e metais pesados) e esporos de fungos. Após a seleção é feita a extração da cera por um processo de fusão realizada por exposição ao sol, ou utilizando sistemas de água quente ou de vapor. O sistema de caldeiras de vapor é um método rápido e eficaz, permite controlar mais facilmente a temperatura de fusão, e possibilita a fusão de ceras em maior quantidade e de qualidades diferentes (cera de favos e de opérculos). A temperatura do vapor deve estar compreendida entre 75 e 90ºC para evitar alterações nas suas propriedades físico-químicas e as cubas de fundição devem ser de aço inox para evitar o seu escurecimento. A cera fundida atravessa depois uma rede metálica capaz de reter as impurezas que podem conter esporos de doenças apícolas, e flui para o exterior, onde é recolhida e solidificada num recipiente passando a designar-se por “broa”. As “broas” produzidas são encaminhadas para as indústrias transformadoras onde sofrem um processo de esterilização que visa garantir a destruição completa dos esporos bacterianos resistentes. Este processo envolve a utilização de temperaturas elevadas durante um longo período de tempo que, como foi referido anteriormente, provoca a destruição ou a alteração da concentração de vários componentes da cera. Em determinadas aplicações muito específicas a cera pode sofrer um tratamento de branqueamento de forma a adquirir uma cor mais clara. A cera pode ser branqueada pela ação da luz solar ao longo do tempo, como pela ação de substâncias químicas, nomeadamente a água oxigenada e ácidos. A água oxigenada exerce a sua função branqueadora através da oxidação das substâncias coradas presentes na cera. No entanto, o processo de oxidação pode provocar a formação de peróxidos na cera, o que poderá ser prejudicial para a sua aplicação como aditivo alimentar. A remoção dos peróxidos da cera pode ser realizada pelo tratamento desta com carvão ativado. Juntamente com a água oxigenada são utilizados ácidos, nomeadamente ácido sulfúrico (para remoção de impurezas), e os ácidos cítrico e oxálico, que previnem a formação de emulsões com águas duras. A cera (branqueada ou não) pode ser moldada e laminada para ser usada novamente na apicultura ou permanecer em fragmentos para outras utilizações (BARROS, 2009). Controlo de qualidade A Diretiva 2000/63/CE e a NP-136 estabelecem critérios de qualidade para a cera de abelhas branca (branqueada) e amarela utilizada para fins alimentares. Uma parte significativa dos parâmetros estabelecidos visam controlar a ocorrência de adulterações da cera por incorporação de parafina, ácido esteárico e sebo (BARROS, 2009).
Usos Na indústria alimentar a cera de abelha pode ser utilizada como aditivo alimentar (E901) numa variedade de produtos. No processamento de produtos de confeitaria (rebuçados, caramelos, pastilhas, etc.), uma camada fina de cera de abelha é usada como polimento e como meio antiaderente, evitando que estes se agreguem. A cera de abelha também é usada como uma tampa hermética na conservação de compotas, e para melhorar o aspeto e o estado de conservação da fruta (GPP, 2013). |
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Referências:
BARROS, A et.al (2009). Manual de Boas Práticas na Produção de Cera de Abelha – Princípios Gerais, FNAP-Federação Nacional dos Apicultores de Portugal, Lisboa. pp. 6-40.
GPP - Gabinete de Planeamento e Políticas (2013). Programa Apícola Nacional 2014-2016. Ministério da Agricultura e do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, 56p.
BARROS, A et.al (2009). Manual de Boas Práticas na Produção de Cera de Abelha – Princípios Gerais, FNAP-Federação Nacional dos Apicultores de Portugal, Lisboa. pp. 6-40.
GPP - Gabinete de Planeamento e Políticas (2013). Programa Apícola Nacional 2014-2016. Ministério da Agricultura e do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, 56p.
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